Artigos - Governo do
PT
Escrito por Rodrigo
Sias
EXCELENTE ARTIGO
A novela do
Mensalão, leitores, enquanto exibe a aparência de produzir uma redentora vitória
do bem sobre o mal,
oculta uma segura vitória do mal sobre o
bem.
Aproximamo-nos dos últimos capítulos da novela "Mensalão", uma das poucas grandes obras da dramaturgia brasileira, encenada para tevê, que não foi mostrada nas telas da Globo. A novela rodou seus capítulos no até então obscuro canal da TV Justiça. Como convém às mais sadias exibições públicas, tudo parece apontar para uma consagradora vitória do bem sobre o mal. As patifarias, as maquinações, os fingimentos, foram, aos poucos, sendo descobertos. A maligna trama, que conspirou contra nossa democracia e contra os valores republicanos, foi aflorando do script e compondo um tecido lógico de participações, motivações e ações.
Foi uma novela diferente.
Muito diferente. Observe que o elenco principal jamais foi visto em cena.
Trata-se, portanto, de uma concepção inovadora, digna de Nelson Rodrigues! Uma
novela conduzida de tal forma que os personagens reais, malgrado terem sido
objeto de todos os capítulos, cada qual tendo seu próprio rol e rolo desfiado
ante os olhos do público, em momento algum se fizeram visíveis.
Mais notável ainda: à medida
em que a urdidura era desvelada e caminhava para seu grand finale, foi ganhando
forma, por trás do numeroso grupo de personagens, a figura central do drama - o
ator sem atuar, o motivador silencioso de toda a obra.
Mesmo inominado no roteiro,
mesmo envolto num véu de silêncios infinitos, ainda assim ele explode no centro
da trama como parte de um processo de elaboração mental do próprio
telespectador. E todos nós, sem exceção, se de repente nos fosse pedido, hoje,
para indicar o nome do cara por trás dos caras, não divergiríamos quanto ao seu
nome, ao seu apelido e ao seu sobrenome. É ou não coisa para se aplaudir de pé,
jogando flores ao palco?
Acertam-se, agora, os lances
finais. Afere-se, na balança de Têmis, o peso das culpas. Os personagens pagarão
por seus erros. Carregarão sobre si o encargo adicional de saberem que alguém,
maior do que todos eles, está em casa, tomando uma cervejinha e assistindo a
novela pela tevê.
Tenho certeza de que o leitor
destas linhas, ao compreender o quanto foi prodigiosa a novela que assistiu nos
últimos meses, deve estar se perguntando: "Por que a colocas no nível de Nelson
Rodrigues? Por que não Shakespeare?".
Respondo: os personagens
canalhas de Nelson Rodrigues foram insuperáveis. Não há nada assim em
Shakespeare. A novela do Mensalão, leitores, enquanto exibe a aparência de
produzir uma redentora vitória do bem sobre o mal, oculta uma segura vitória do
mal sobre o bem.
Em algum lugar do país, o cara
por trás dos caras afirma que a novela não existiu e ri do drama vivido pelos
que foram apanhados nas largas malhas com que nossas instituições capturam
peixes!
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